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  • Foto do escritorAna Salviatti

A assim chamada Acumulação Primitiva

A pré-história do capital é apresentada no capítulo XXIV de O Capital. Após a apresentação nos capítulos anteriores da sua teoria do valor, Marx propõe então buscar, na História, o período anterior à circulação e produção de capital, o período no qual as condições para a sua reprodução foram construídas.

Ou seja, em O Capital, é feito um parênteses entre capítulos de desenvolvimento teórico-categorial, para a apresentação de uma síntese sobre o processo histórico que assistiu ao surgimento dos pré-requisitos fundantes do modo de produção capitalista propriamente dito. A assim chamada acumulação primitiva.


Veja o vídeo sobre Formas Antediluvianas:


Desta feita, Marx inicia sua exposição observando que é na separação entre o trabalhador e os meios de produção que está o ponto inicial de uma longa cadeia de eventos que promoverão o Modo de Produção Capitalista.

A condição do camponês ligado à terra e detentor dos instrumentos de trabalho paulatinamente foi erodida para dar espaço à noção da propriedade privada, garantida por um Estado cada vez mais centralizado - vide as Revoluções Burguesas pelas quais a Inglaterra precocemente passou durante o século XVII.


O Estado que surge de tais Revoluções varrera das fronteiras inglesas todo e qualquer rastro de bens não alienáveis de seu território. Para isso, expulsa a Igreja católica, detentora de grande parte das terras através da Revolução Anglicana, e os camponeses, por meio dos enclausure lands, iniciados ainda com Elizabeth I.

Assim, a terra passara às mãos de proprietários privados, e os camponeses expropriados, destituídos de sua tradicional forma de sobrevivência, foram compelidos às cidades e a nela sofrer toda a sorte de que a legislação contra vagabundagem lhes prometia.

No caso inglês, ao mesmo tempo em que a Revolução Anglicana expulsara a maior proprietária de terras do território, ela fortalecia a figura do rei, que consolidara seu poder político, conforme apoiara a expansão do poder econômico advindo do comércio exercido pela nascente classe burguesa. Sucedera então à revolução religiosa uma outra, a Gloriosa, que transferira o poder do Estado das mãos do rei à agora amadurecida classe burguesa britânica.

Se por um lado o Estado capitalista operara a separação legal e formal de mão de obra e meios de produção, por outro, ele criara os meios necessários para o investimento da expansão comercial e marítima da nação. E é nessa ação que reside outra importante forma de acumulação primitiva de capital: a dívida pública.

Eis como ela funciona. O Estado possui múltiplas funções, dentre as quais a arrecadação de tributos, taxas e impostos dos seus contribuintes e do meio circulante; desse valor temos então a receita do Estado. Por outro lado, o Estado é também um tomador de empréstimo e quando o toma emite títulos da dívida pública, papéis que garantem aos seus credores o pagamento regular de juros.

Os empréstimos permitem aos Estados, por exemplo, enfrentar situações emergenciais, fazer investimentos internos em infraestrutura, etc. sem que precise aumentar imediatamente a sua tributação; todavia, esse movimento é contínuo e o Estado passa a ser um grande tomador de recursos a juros do mercado.

Diante disso, o Estado estende seu sistema tributário sobre uma grande gama de operações, das quais não exclui nem os meios de subsistência mais básicos, encarecendo o acesso aos mesmos e aprofundando a já desigual distribuição de riqueza entre as classes.

Ao fim, todo valor adiantado ao Estado na tomada de empréstimos é na verdade a alienação do próprio Estado, pois, ao emitir papéis da dívida pública o Estado está disponibilizando ao mercado a transferência dos recursos arrecadados de toda a nação.

Para garantir que a produção interna do país continue a crescer, o Estado lança mão de outro dispositivo da acumulação primitiva, o protecionismo, que visa proteger a burguesia nacional da concorrência externa, como tentou proteger e fomentar sua própria capacidade de tributação. O sistema colonial surgira aos olhos do Estado como uma outra alavanca importante da acumulação primitiva, ao ser capaz de garantir o monopólio de matérias-primas, o que por sua vez impulsionava seus ganhos econômicos e, portanto, sua capacidade tributária.

A Acumulação Primitiva, ou acumulação primordial, nada mais foi do que a capacidade de criar e/ou extrair riqueza em estado puro e colocá-la em benefício do embrionário modo de produção capitalista, como. por exemplo, a importação de matérias-primas coloniais, e a emissão de títulos públicos para os credores do Estado.

Ao longo de sua apresentação, Marx expõe que não haveria um encadeamento necessariamente cronológico, quanto menos etapista de todas estas possíveis extrações de riquezas.

Em torno desta importante contribuição, muitos autores marxistas defendem a interpretação de que a Acumulação Primitiva esteve presente tanto como condição necessária para o surgimento do modo de produção capitalista, quanto continua a existir ao longo do modo de produção capitalista. Logo, a Acumulação Primitiva seria algo como uma condição Antediluviana do capital.

A favor dessa perspectiva estaria, por exemplo, a ininterrupta exploração das fontes de matérias-primas e a complexa expansão da dívida pública dos Estados e seu desdobramento no sistema internacional de crédito.

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